Publicado originalmente em: oglobo
Psicóloga alerta pais para cuidados com seus filhos adolescentes, que podem ficar deprimidos com o afastamento da escola e dos amigos
Se controlar a ansiedade se tornou desafio no contexto de incertezas e inseguranças da pandemia do novo coronavírus, imagina como está a cabeça de um adolescente? Além dos efeitos do turbilhão hormonal e emocional comum da faixa etária, eles mudaram as relações familiares e os formatos em que se dão a sexualidade e sociabilidade — temas centrais de seu desenvolvimento cognitivo e afetivo. O que é, para um jovem, entre 12 e 17 anos, sair da escola? Ver o objetivo bem marcado de um Enem sumir do mapa sem um preparo específico? Como é não poder encontrar com os amigos?
Especializada no atendimento a adolescentes e em Saúde da Mulher, a psicóloga Érika Lopes alerta para uma necessidade que pode estar invisível no seio familiar: a dos jovens, que no meio de seu “preparo para o mundo”, se viram perdidos em suas bases e precisam de apoio.
— A psicologia divide o desenvolvimento humano em etapas. Nas duas primeiras, a pessoa ora se percebe como indivíduo, ora como parte de uma família. O “terceiro campo” é o social, quando a pessoa para de se voltar apenas para o pai, a mãe e os irmãos e se relaciona com o mundo, com o trabalho, os amigos. A adolescência é o momento de entrada neste terceiro campo, quando ela deixa de ser criança. E a juventude se vê privada, neste momento, desta vivência em grupo, “da galera” — afirma Érika Lopes, que diz que pais devem ficar atentos a mudanças de comportamento dos filhos para perceber se eles estão mais fechados ou melancólicos.
— A adolescência já é, desde antes da Covid-19, uma etapa onde se registram altos índices de crises de ansiedade, depressão e suicídio. E a situação atual pode ser um complicador na saúde mental dos jovens — diz a psicóloga, que propõe, no quadro abaixo, uma série de atividades para que jovens se mantenham sãos durante o isolamento social.
- O momento de instabilidade gera estresse e é normal sentir emoções como medo e a ansiedade. Se isso acontecer, dê vazão a esses sentimentos e sensações. Pode chorar, escrever (ou anotar em um papel o que está sentindo) ou conversar com seus pais ou um amigo. Aproximar-se de uma rede de apoio é importante. Caso essas emoções estejam muito intensas, a ponto de impedir que realize suas atividades, ou caso se sinta sozinho, procure um profissional de saúde.
- Sua vida social é importante e pode e deve continuar; use as ferramentas tecnológicas em prol disso. Organize festas e piqueniques online em plataformas como o aplicativo Zoom.
- Tenha responsabilidade quanto aos conteúdos que assiste e muito cuidado com o que posta e com quem fala na internet.
- Busque conhecimento. Instituições como a FGV (Fundação Getulio Vargas, o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), o Enap (Escola Nacional de Administração Pública) e a rede Ivy League Courses oferecem cursos online e, muitas vezes, gratuitos. Pesquise assuntos de seu interesse e aproveite para pensar o seu futuro profissional. Mas cuidado com o produtivismo. Não se force a aprender tudo de uma vez ou coisas que não te interessam em nada.
- Você pode elaborar e construir redes de apoio à comunidade, como coletivos online que promovam atos solidários (ajudando idosos a fazerem compras de alimentos, remédios por aplicativos ou telefone, por exemplo) ou páginas com informações relevantes para a época e com serviços locais sem divulgação.
- Descanse! Longos períodos no celular ou no computador e a interação prolongada nas redes sociais causam desgastes físicos e, algumas vezes, emocionais. O uso prolongado das telas também causa estresse. Deite-se no escuro um pouco para relaxar a visão, ouça músicas e desacelere.
- Se o excesso de informações sobre a Covid-19 estiver te causando muitas apreensões, modere o acesso.
- Ter um tempo sozinho é importante. Negocie com seus pais momentos de privacidade no quarto ou algum cômodo da casa.
- Faça atividades físicas. Vários aplicativos e academias têm oferecido virtualmente aulas e séries de exercícios funcionais que podem ser praticados em casa.
- As inseguranças sobre o futuro e a situação financeira podem estar deixando os adultos altamente estressados e o ambiente mais propenso a conflitos. Isso pode afetar você também de algum modo. Veja se há algo a fazer que esteja a seu alcance e engaje-se. Aceite, também, o que não tem como mudar. Isso diminuirá a sua ansiedade.
- Converse com seus pais e procure saber como estão e se precisam de alguma ajuda, como, por exemplo, no uso das ferramentas tecnológicas ou outras coisas em que você tenha habilidade. Cuide também das tarefas domésticas, que é de responsabilidade de todos que vivem na casa e não só dos adultos.
- Faça uma faxina nas suas coisas e separe o que usa do que não usa mais, como, por exemplo, brinquedos e livros infantis. Reserve para doação.
- Há pesquisas indicando um aumento do número de violência doméstica, física e sexual, neste período. Alguns canais de ajuda para essa situação estão abertos. Caso não tenha clareza se o que vive é uma situação de abuso, procure um profissional de saúde.
- Caso esteja se sentindo deprimido, sem vontade de viver ou pensando em suicídio, disque 100 ou procure ajuda de uma pessoa em que confia ou profissional de saúde.
Fonte: Érika Lopes, psicóloga especializada no atendimento a adolescentes e Saúde da Mulher