Ricardo Brito - Agência Estado
Declaração de 'vacância' de João Goulart em 1964 abriu caminho para institucionalizar a ditadura militar
João Goulart foi afastado do cargo entre as noites dos dias 1º e 2 de abril de 64 |
Brasília - Quase 50 anos após o golpe militar, o
Congresso Nacional aprovou no início da madrugada desta quinta-feira um projeto
de resolução que anula a sessão do Poder Legislativo que declarou vaga a
presidência da República e destituiu do cargo o então presidente João Goulart.
A matéria foi tratada pelos parlamentares como uma "reparação" e
"desculpa" histórica à decisão do Parlamento que, entre a noite dos
dias 1º para 2 de abril de 1964, retirou formalmente Goulart da chefia do Executivo
e abriu caminho para institucionalizar a ditadura militar.
O presidente do Congresso, senador Renan Calheiros
(PMDB-AL), anunciou que futuramente vai realizar uma sessão solene em
homenagem. A sessão foi acompanhada por parentes de João Goulart, como seu
filho João Vicente Goulart. Na semana passada, os restos mortais do
ex-presidente foram exumados a fim de se determinar se ele foi envenenado ao
morrer no exílio na Argentina, no dia 6 de dezembro de 1976.
Durante os debates, o deputado federal e militar da
reserva Jair Bolsonaro (PP-RJ) foi o único a criticar a proposta. Segundo ele,
a medida tem por objetivo tentar, com a anulação do ato de vacância,
"apagar um fato histórico de modo infantil". "Isso é mais do que
stalinismo, quando se apagavam fotografias, querem apagar o Diário do
Congresso", disse o deputado.
O senador Pedro Simon (PMDB-RS), um dos autores do
pedido e amigo de João Goulart, afirmou que o momento é de se exaltar o
"momento histórico". Ele lembrou que Jango, como era conhecido, ainda
estava dentro do país quando foi apeado do poder. "Não vamos reconstituir
os fatos. A história apenas vai dizer que, naquele dia, o presidente do
Congresso usurpou a vontade popular de maneira estúpida e ridícula, depondo o
presidente da República", declarou, no discurso mais aplaudido em
plenário.
O deputado Domingos Sávio (PSDB-MG), relator do
projeto de resolução, defendeu que o Congresso precisa ter "coragem"
para admitir que naquela noite de 1964 ocorrera uma das "páginas sombrias
da sua história". "Eu fico muito feliz que nós estamos vendo uma das
páginas mais lindas deste país", disse o tucano, ao dar parecer favorável
ao pedido.
Desta vez, o presidente do Senado conseguiu
derrubar a tentativa de Jair Bolsonaro de derrubar a sessão por falta de
quorum, como ocorreu na sessão anterior. Renan Calheiros usou artigos do
regimento interno da Câmara e da Constituição para barrar a iniciativa do
deputado do PP. "Vossa Excelência, contra todos os lideres, todas as
bancadas, não pode paralisar os trabalhos do Congresso Nacional, contrariando a
Constituição Federal", afirmou.
Após a derrota, Jair Bolsonaro disse ter ficado
"satisfeito" com a decisão do Congresso que, na opinião dele,
reconhece que o golpe não teria partido dos militares, mas sim pelo próprio
Poder Legislativo.
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